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14/09/17 |   Agricultura familiar

Agricultura Familiar nos EUA: concentrada, rica, mas também vulnerável

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O processo de concentração da produção e da riqueza agrícola nas mãos de uma minoria de grandes fazendeiros, já detectado no Brasil, também acontece nos Estados Unidos e está se intensificando. Estudos do Serviço de Pesquisa Econômica do Departamento de Agricultura mostram que, desde 1991, a maior parte da produção agrícola vem se concentrando no que chamam de fazendas “milhões de dólares”- pouco mais de 65 mil propriedades em que a renda bruta anual é igual ou maior que um milhão de dólares.

Em 1991, essas fazendas respondiam por um terço do valor global da produção agrícola estadunidense, mas em 2015 já respondiam por 52% desse valor. Nesse período, as maiores fazendas “milhões de dólares” (renda bruta igual ou maior que 5 milhões de dólares) praticamente dobraram a sua participação na formação da renda agrícola, pulando de 13% para 23% desse montante. As menores fazendas “milhões de dólares” (renda bruta entre um milhão e cinco milhões de dólares) também aumentaram a sua participação, de 19% para 29%.

Esse crescimento implicou na redução da participação das propriedades da denominada “Pequena Agricultura Familiar” (renda bruta até 350 mil dólares/ano), que, em conjunto, reduziram sua participação, de cerca de 45% para pouco mais de 24% do valor da produção. A Agricultura Familiar dita “de Porte Médio” manteve a sua contribuição, em torno de 24% do total do valor da produção.

O processo de concentração é antigo. Douglas W. Allen e Dean Lueck, em seu livro "The Nature of Farm" (2002), mostram que, em 1920, havia nos EUA 6,45 milhões de propriedades rurais. O Serviço de Pesquisa Econômica avalia que em 2015 esse número havia se reduzido para 2,06 milhões de propriedades.

Allen e Lueck mostram também que essa redução se deu em razão da concentração das terras nas mãos de menor número de proprietários: se, de um lado, o número de propriedades reduziu-se a menos de um terço, o tamanho médio das propriedades multiplicou-se por mais que três vezes, aumentando de 60 para 197 hectares.

O livro mostra também que, como no Brasil, o acesso à tecnologias e inovação foram os vetores da concentração produtiva. Em 1920, as propriedades rurais dos EUA tinham ainda 25 milhões de cavalos e mulas de tração, mas já contavam com 246 mil tratores, 4 mil colheitadeiras de grãos e 139 mil caminhões; oitenta anos depois, em 1997, já eram 3,9 milhões de tratores, 460 mil colheitadeiras, 3,5 milhões de caminhões e praticamente nenhum animal de tração.

Nesse período, o rendimento físico das lavouras de trigo quase triplicou e a do milho mais do que quadruplicou. Também o êxodo rural foi acentuado: em 1920, 30,1% da população dos EUA viviam e produziam nas fazendas. Em 1995, apenas 1,9% do total da população permaneciam como produtores rurais.

 

Agricultores ricos...

Os estudos mostram que a renda anual média do conjunto das famílias agrícolas é maior que a renda média anual do conjunto de todas as famílias do país. Somente 31% das famílias rurais têm renda anual inferior à renda anual média do país, enquanto que 51,4% das famílias urbanas têm renda anual menor que a média nacional.

Colocado de outra maneira, e ao contrário do Brasil, nos EUA, em média as famílias rurais são mais ricas que as famílias urbanas e há mais pobreza nas cidades que no campo. De fato, os dados do relatório mostram que, em 2015, o patrimônio líquido médio (bens menos dívidas) das famílias rurais (827 mil dólares) foi muito maior que a média do patrimônio líquido (82,6 mil dólares) de todas as famílias dos EUA.

Uma das razões para isso é o nível tecnológico das fazendas: não só as exigências do inverno rigoroso e de grandes áreas de semiárido, que não permite uma agricultura meramente extrativa e artesanal, bem como a longa tradição de pesquisa agrícola pública, iniciada em 1875, conduziram à consolidação de sistemas de produção agrícola intensivos em conhecimentos e tecnologia.

Tudo isso converge para reforçar uma atividade estritamente empresarial, com investimentos relevantes em máquinas, equipamentos, instalações e genética de alta qualidade e que resultam em produtividade e produção elevadas.

 

...Mas vulneráveis

Mas, nem por isso, a agricultura familiar americana está livre de problemas financeiros que, com frequência, significam a perda da propriedade para agentes financeiros. Os dados do relatório do Serviço de Pesquisa Econômica mostram que, em média, 69% dos agricultores operam naquilo que os pesquisadores chamam de “zona vermelha”, ou seja, com alto risco de ter problemas financeiros.

Estar na "Zona Vermelha" significa trabalhar com margens de lucro operacional menores que 10%. Considerados todos os produtores, apenas 8% operam na “zona amarela” (lucro entre 10% e 25%), com risco médio de problemas financeiros, e 19% do total na “zona verde” (lucros superiores a 25%), com baixo risco de problemas financeiros.

Já a maior parte dos agricultores da “Pequena Agricultura Familiar” corre o risco de “quebrar”, pois opera com margens de lucro pequenas ou mesmo negativas, ou seja, com prejuízos: de 59% a 78% deles, dependendo do tipo de fazenda em que se enquadram (veja gráfico), estão na “zona vermelha”. Mas não estão sozinhos nisso: 54% da “Agricultura Não-Familiar” e 46% da “Agricultura Familiar de Porte Médio” também estão nessa situação.

Por sua vez, a “Agricultura Familiar de Larga Escala” está em melhor situação, com a maioria das fazendas operando com margens de lucro operacional acima de 10%. Ainda assim, 36% das fazendas do subtipo  “Grande” e 26% das do subtipo “Muito Grandes” operam na “zona vermelha”.

A situação poderia ser pior não fosse a renda bruta dos produtores acrescida pelas indenizações do “Seguro Safra” e pelos “Pagamentos do Governo”, ou seja, incentivos que o Governo dos EUA dá aos produtores para que atinjam metas governamentais relacionadas à produção e à conservação ambiental.

As fazendas da “Pequena Agricultura Familiar”, subtipo “Vendas Moderadas”, e dos tipos “Porte Médio” e “de Larga Escala” recebem 74% dos incentivos para produção de determinadas commodities e 80% dos incentivos para uso de práticas ambientais e conservacionistas nas terras em cultivo. Esses dois últimos tipos recebem ainda 69% das indenizações do “Seguro Safra”, por perdas na produção.

Já as fazendas da “Pequena Agricultura Familiar”,  subtipos “Aposentadoria”, “Ocupação Não Agrícola” e “Baixas Vendas” receberam 79% dos incentivos para a manutenção de áreas de Reservas de Conservação Ambiental.

 

Renato Cruz Silva (MTb 610/04/97v/DF)
Secretaria de Inteligência e Macroestratégia

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